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Black-Scholes na prática: como as empresas utilizam o valor justo

Escrito por Danilo Ferraz | Oct 24, 2025 4:46:15 PM

Na prática, observam-se duas abordagens predominantes para o uso do valor justo em programas de opções: uma voltada exclusivamente à contabilidade e outra que o utiliza tanto para fins contábeis quanto para o dimensionamento da outorga.  

Essa distinção é estratégica e impacta diretamente a forma como os planos são estruturados e percebidos. 

Abordagem 1: valor justo como referência contábil 

Nesta abordagem, a empresa define a quantidade de opções com base no preço da ação na data da outorga. O valor justo calculado pelo modelo Black-Scholes é utilizado exclusivamente para atender às exigências contábeis, como as previstas no CPC 10 e IFRS 2. 

Exemplo: uma empresa deseja conceder um valor alvo de R$ 100.000 a um executivo. 

  • Valor-alvo da outorga: R$ 100.000 
  • Preço da ação no dia: R$ 20,00 
  • Valor justo (Black-Scholes): R$ 8,00 

Cálculo da outorga: 

R$ 100.000 ÷ R$ 20,00 = 5.000 opções concedidas 

Despesa contábil registrada: 

5.000 opções × R$ 8,00 = R$ 40.000 

Implicação: 

Há uma desconexão entre o valor percebido da outorga (R$ 100.000) e o valor que será reconhecido como despesa contábil (R$ 40.000). Essa abordagem prioriza o valor de face do instrumento, tratando o custo contábil como uma consequência separada. 

Abordagem 2: valor justo como base para outorga e contabilidade 

Nesta metodologia, o valor justo é considerado o custo real da concessão e serve como base tanto para o dimensionamento da outorga quanto para o registro contábil. A quantidade de opções é calculada dividindo-se o valor-alvo pelo valor justo. 

Exemplo: uma empresa deseja conceder um valor alvo de R$ 100.000 a um executivo. 

  • Valor-alvo da outorga: R$ 100.000 
  • Valor justo (Black-Scholes): R$ 8,00 

Cálculo da outorga: 

R$ 100.000 ÷ R$ 8,00 = 12.500 opções concedidas 

Despesa contábil registrada: 

12.500 opções × R$ 8,00 = R$ 100.000 

Implicação: 

A despesa contábil reflete exatamente o valor-alvo da remuneração, promovendo alinhamento entre custo e benefício percebido. 

Abordagem 3: foco no potencial de ganho futuro (Payoff Esperado) 

Nesta abordagem, a empresa projeta um cenário de valorização futura da ação para definir a quantidade de opções. O cálculo é feito com base no ganho esperado por opção (payoff), considerando uma meta de preço. 

Exemplo: para ilustrar o risco potencial, vamos ajustar a meta. 

  • Valor-alvo de ganho: R$ 100.000 
  • Preço da ação (strike): R$ 20,00 
  • Preço-alvo futuro: R$ 22,00 
  • Payoff esperado por opção: R$ 2,00 

Cálculo da outorga: 

R$ 100.000 ÷ R$ 2,00 = 50.000 opções concedidas 

Despesa contábil registrada: 

50.000 opções × R$ 8,00 = R$ 400.000 

Implicação: 

Embora essa abordagem tenha forte apelo motivacional, ela carrega um risco financeiro elevado. O número de opções concedidas pode ser excessivo, resultando em uma despesa contábil muito superior ao ganho originalmente planejado. No exemplo, para um ganho-alvo de R$ 100.000, a empresa reconheceria uma despesa de R$ 400.000. 

Qual método é o mais adequado? 

Não existe uma resposta universal. A escolha depende da filosofia de remuneração da empresa, de sua estratégia de retenção e dos objetivos do plano de incentivo.  

O essencial é que os responsáveis pelos programas de ILP compreendam as diferenças entre as abordagens, suas premissas e implicações.  

Com esse conhecimento, é possível tomar decisões mais conscientes e alinhadas à realidade financeira e estratégica da organização. 

Como cada variável impacta o valor justo da opção 

A tabela abaixo resume os principais fatores que influenciam o valor de uma call option e a lógica por trás de cada movimento: 

Variável 

Movimento 

O Valor da Opção (Call) 

Por quê?  

Preço da Ação (S) 

Aumentar 

Sobe 

O direito de comprar algo por um preço fixo fica mais valioso se o preço de mercado desse algo sobe. 

Preço de Exercício (K) 

Aumentar 

Cai 

O direito de comprar algo a R$ 30 é menos valioso do que o direito de comprar a mesma coisa a R$ 25. 

Tempo até o Vencimento (t) 

Aumentar 

Sobe 

Mais tempo significa mais oportunidades para a ação subir. Aumenta a chance de um cenário favorável ocorrer. 

Volatilidade (σ) 

Aumentar 

Sobe 

 Mais instabilidade aumenta a chance de movimentos extremos. Como o ganho é ilimitado e a perda é travada, a instabilidade é benéfica para o detentor da opção. 

Taxa de Juros (r) 

Aumentar 

Sobe 

O custo de adquirir a ação no futuro (preço de exercício) se torna menor em valor presente, aumentando o valor da opção. 

Conclusão 

A aplicação prática do modelo Black-Scholes vai muito além da contabilidade. Ela influencia diretamente o desenho dos planos de incentivo, a percepção de valor pelos beneficiários e o impacto financeiro para a empresa.  

Ao entender as diferentes abordagens e os fatores que compõem o valor justo, as organizações podem estruturar programas mais eficazes, transparentes e alinhados à sua estratégia de longo prazo.