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Incertezas jurídicas e impactos quantitativos do ILP nas empresas brasileiras

Escrito por Wil Ferreira | Sep 23, 2025 11:19:10 PM

Os planos de Incentivos de Longo Prazo (ILPs) tornaram-se ferramentas estratégicas para alinhar executivos à criação de valor sustentável nas empresas. No entanto, a ausência de um marco regulatório específico no Brasil gera insegurança jurídica e impactos financeiros significativos. 

Foi esse o ponto central abordado por Daniel Eloi, sócio fundador da Pris, durante o painel Cenário legislativo e normativo em ILP no Pris Day 2025.

A insegurança normativa e suas consequências 

Diferentemente da Participação nos Lucros e Resultados (PLR), regulamentada pela Lei nº 10.101/2000, não existe no Brasil uma lei que defina claramente a natureza jurídica dos ILPs. Hoje, convivem interpretações divergentes: 

  • Receita Federal: tende a classificar ILPs como remuneração. 
  • Justiça do Trabalho: em decisões recentes, reconheceu o caráter mercantil em planos com voluntariedade, risco e onerosidade. 
  • STJ: em 2024, reconheceu o caráter mercantil de um plano de Stock Options para fins de IRPF, em decisão com efeito vinculante (embora ainda haja recurso da Procuradoria da Fazenda Nacional).
  • CARF: admite hipóteses de natureza mercantil, mas em situações muito restritas, aguardando consolidação após a decisão do STJ. 

Esse cenário instável amplia os riscos para as companhias, que precisam escolher entre: classificar seus planos como mercantis, assumindo risco de questionamento fiscal ou remuneratórios, elevando significativamente seus custos.

O peso financeiro da classificação 

Daniel Eloi destacou a diferença prática dessa escolha:

No exemplo apresentado abaixo, considerando a outorga de 100 mil opções a um executivo: 

O resultado é claro: o custo quase dobra para a companhia, enquanto o ganho do executivo cai em torno de 20%. 

Essa disparidade reduz a atratividade do ILP como mecanismo de retenção, especialmente quando comparado a pacotes internacionais.

Como as empresas tratam o ILP hoje 

Na prática, observa-se uma tendência: 

  • Planos de ILP que não envolvem Stock Options são majoritariamente classificados como remuneração.
  • Stock Options convencionais, em alguns casos, ainda recebem tratamento mercantil, mas com cautela e constante acompanhamento das decisões judiciais 

Esse ambiente de incerteza impacta diretamente a previsibilidade dos custos e a segurança para executivos que recebem o benefício. 

O contraste internacional: Estados Unidos como referência 

Nos Estados Unidos, a tributação dos ILPs varia conforme o instrumento utilizado. Há regras específicas para os diferentes tipos de planos:  

Incentive Stock Options (ISO) 

Legislação: IRC §422 
Resumo: concedidas apenas a empregados, com tratamento fiscal preferencial. Se mantidas por mais de 2 anos após a concessão e 1 ano após o exercício, os ganhos são tributados como ganho de capital de longo prazo. 
Tributação: apenas na venda das ações.

Non-qualified Stock Options (NSO)

Legislação: IRC §83 
Resumo: opções mais flexíveis, oferecidas também a consultores e conselheiros. O ganho na diferença entre o preço de exercício e o valor de mercado é considerado renda ordinária. 
Tributação: no exercício (compra da ação). 

Restricted Stock Units (RSU) 

Legislação: IRC §83 
Resumo: direitos futuros de receber ações, sujeitos a vesting. O valor das ações é tributado como renda ordinária quando são entregues. 
Tributação: no vesting (recebimento da ação). 

Restricted Stock Awards (RSA) 

Legislação: IRC §83 + Eleição 83(b) 
Resumo: ações com restrições, já pertencentes ao colaborador. Pode-se optar por antecipar a tributação via eleição 83(b), pagando imposto com base no valor na outorga. 
Tributação: regra geral, no vesting. Com eleição 83(b): na outorga.

Employee Stock Purchase Plans (ESPP) 

Legislação: IRC §423 
Resumo: permite compra de ações com desconto via dedução salarial. Se seguir as regras da seção 423, o plano oferece tratamento fiscal favorável. 
Tributação: na venda das ações, apenas sobre o valor do desconto (se qualificado).

Essa segmentação garante previsibilidade: empresas sabem exatamente qual será o custo de cada estrutura, e executivos conhecem os impactos tributários antes mesmo da adesão. 

O contraste com o Brasil é evidente: enquanto aqui a ausência de regras claras gera litígios, nos EUA a diversidade de normas favorece a ampla utilização do ILP.

O precedente da PLR: uma lição para o ILP 

A experiência brasileira com a PLR mostra que segurança jurídica é determinante para o sucesso de modelos de remuneração variável. A Lei nº 10.101/2000 deixou claro que a PLR não tem natureza salarial, afastou encargos trabalhistas e incentivou sua adoção. 

Resultado: a PLR se consolidou como prática corrente nas empresas, enquanto o ILP ainda é pouco explorado justamente pela ausência de regras equivalentes.

O caminho regulatório 

O PL nº 2.724/2022, conhecido como Marco Legal das Stock Options, já foi aprovado no Senado e tramita na Câmara dos Deputados 

Trata-se de um avanço importante, mas que não resolve todas as questões, já que o universo dos ILPs vai além das opções de ações. 

Seguindo o exemplo norte-americano, será necessário desenvolver um conjunto de regras específicas para diferentes tipos de ILP, de forma a assegurar segurança  
jurídica e ampliar a competitividade do Brasil no mercado global.

Conclusão 

O Incentivo de Longo Prazo é uma ferramenta estratégica para alinhar interesses de executivos e acionistas. Contudo, no Brasil, a ausência de um marco regulatório claro compromete sua eficácia. 

Como destacou Daniel Eloi no Pris Day 2025, a insegurança jurídica não apenas aumenta os custos para as empresas, como reduz o ganho líquido dos participantes, um cenário em que todos perdem. 

Enquanto não avançamos para uma legislação madura e abrangente, como já ocorreu nos EUA e com a PLR no Brasil, o ILP continuará subutilizado.