No final de 2024, o Banco Central do Brasil (Bacen) publicou a Resolução BCB nº 432/2024, estabelecendo diretrizes para a política de remuneração dos administradores de corretoras, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, sociedades corretoras de câmbio, administradoras de consórcio e instituições de pagamento autorizadas a operar no país.
A norma exige que essas instituições alinhem suas políticas de remuneração à estrutura e ao perfil de risco do negócio, promovendo práticas responsáveis de gestão. Com isso, a remuneração (tanto fixa quanto variável) deve refletir não apenas o desempenho, mas também o compromisso com a continuidade e a solidez da organização.
O objetivo central é evitar que os modelos de remuneração incentivem comportamentos que aumentem a exposição a riscos, comprometendo a estabilidade da instituição. Ao mesmo tempo, reforça-se a importância de alinhar os interesses dos executivos aos objetivos estratégicos da empresa, promovendo uma cultura voltada para resultados sustentáveis no curto, médio e longo prazo.
Principais exigências que impactam os modelos de remuneração
1- Forma de pagamento
A remuneração variável pode ser feita em dinheiro, ações, instrumentos baseados em ações ou outros ativos, sendo que a escolha no formato deve refletir o nível de responsabilidade e a função do executivo.
Essa dinâmica permite que as instituições adotem instrumentos de longo prazo que reforcem o vínculo entre o executivo e o desempenho da empresa, por meio de programas de ações ou opções, por exemplo, promovendo o alinhamento com os interesses dos acionistas e ganhando mais aderência ao modelo de negócio e à estratégia da organização.
2- Equilíbrio entre remuneração fixa e variável
A política deve assegurar uma proporção equilibrada entre os dois componentes, permitindo inclusive a redução total da parcela variável em caso de desempenho insatisfatório.
Essa flexibilidade reforça o papel da remuneração como instrumento de gestão de riscos, evitando recompensas que não estejam em sintonia com os objetivos e resultados esperados pela organização.
3- Critérios de definição e pagamento
A remuneração variável deve considerar fatores como risco, desempenho, lucratividade, geração de caixa e o contexto econômico.
Essa abordagem permite que os incentivos estejam diretamente conectados à criação de valor a longo prazo, evitando distorções que premiem resultados pontuais ou desconectados da estratégia da companhia.
Assim, a política de remuneração se torna mais robusta e alinhada à gestão de riscos, à governança e à cultura organizacional.
4- Pagamento em ativos de longo prazo
A norma estabelece que, no mínimo, 50% da remuneração variável dos administradores deve ser paga em ações, instrumentos baseados em ações ou outros ativos compatíveis com a criação de valor a longo prazo e com o horizonte de tempo dos riscos assumidos.
Essa exigência reforça o papel dos Incentivos de Longo Prazo (ILPs) como ferramentas estratégicas de alinhamento entre os interesses dos executivos e os objetivos sustentáveis da instituição.
Para empresas não listadas em bolsa ou que não utilizam instrumentos baseados em ações, a norma determina que o pagamento seja vinculado à variação do valor contábil do patrimônio líquido, excluindo os efeitos de transações com os sócios, contribuindo para que o incentivo esteja atrelado à evolução real da empresa.
Além disso, a resolução ressalta que os ativos utilizados devem ser avaliados a valor justo, ou seja, pelo preço que seria obtido em uma transação realizada em condições normais de mercado, assegurando transparência e equidade na remuneração.
As regras não se aplicam a administradores cuja remuneração variável seja inferior a 10% de sua remuneração total.
5- Diferimento da remuneração
A norma exige que no mínimo 40% da remuneração variável dos administradores seja diferida, ou seja, paga futuramente. Esse percentual deve ser aumentado conforme o nível de responsabilidade do executivo, refletindo o impacto potencial de suas decisões sobre a instituição.
Além disso, o período mínimo de diferimento deve ser de três anos, devendo ser definido com base nos riscos envolvidos e na natureza da atividade desempenhada.
Ao postergar o pagamento, a norma contribui para orientar as decisões dos executivos para o médio e longo prazo, desestimulando ações que visem ganhos imediatos em detrimento da sustentabilidade financeira da empresa. Esse mecanismo reforça o alinhamento entre os interesses individuais e os objetivos estratégicos da organização, promovendo uma cultura de responsabilidade e foco na criação de valor duradouro.
6- Reversão de valores diferido
A resolução também prevê que, no caso de redução significativa do lucro recorrente realizado ou de ocorrência de resultado negativo da instituição ou da unidade de negócios durante o período de diferimento, as parcelas diferidas ainda não pagas devem ser revertidas proporcionalmente à redução no resultado.
Neste sentido, podemos afirmar que a norma introduz um importante mecanismo de prudência na remuneração variável de administradores: o Malus.
O Malus, prática já estabelecida no contexto de remuneração executiva no cenário internacional, aos poucos vem ganhando notoriedade no Brasil, com a criação de diretrizes que formalizam e permitem que as empresas reduzam ou cancelem valores ainda não pagos ao executivo, caso haja desempenho insatisfatório, descumprimento de regras internas ou exposição excessiva a riscos.
Em outras palavras, o executivo não apenas precisa entregar resultados, mas também garantir que esses resultados sejam sustentáveis e estejam em conformidade com a governança da empresa.
7- Incentivos de Longo Prazo: de tendência à estratégia regulatória
A norma estabelece que políticas de remuneração variável devem seguir critérios de proporcionalidade, diferimento e alinhamento com o desempenho sustentável, práticas que são cada vez mais necessárias e presentes no contexto de empresas responsáveis.
Embora voltada a um grupo específico de instituições, a Resolução BCB nº 432/2024 reforça princípios que já vêm sendo consolidados no cenário corporativo nacional, bem como por meio de outras regulamentações, como a Resolução CMN nº 5.177/2024, voltada às instituições financeiras e cooperativas de crédito.
Ambas caminham na mesma direção: remuneração como instrumento de governança, gestão de riscos e sustentabilidade, servindo como estratégia de negócio, uma responsabilidade corporativa e um compromisso com o futuro.
Na prática, é possível observar que o mercado já vem se antecipando, sendo que diversas empresas do setor, como a XP, Banco Inter, Stone, Modal, PagSeguro, Cielo, vêm fortalecendo suas políticas de remuneração com programas de Incentivo de Longo Prazo estruturados, que incluem pagamento diferido, uso de ações ou ativos equivalentes, e critérios de performance alinhados à geração de valor, ou seja, diretrizes alinhadas com as recomendações da norma.
Esses exemplos mostram que, mesmo antes da obrigatoriedade, o mercado já vem adotando práticas que fortalecem a governança e o alinhamento entre executivos e acionistas, consolidando uma cultura de longo prazo, onde a remuneração variável passa a ser uma das ferramentas mais poderosas à disposição das empresas. Quando bem desenhada, ela alinha interesses, retém talentos e promove uma cultura de longo prazo.
Prazos e adequação
A Resolução entrou em vigor em 1º de janeiro de 2025, com prazo de adequação até 31 de dezembro de 2025 para as instituições que ainda não estavam obrigadas a implementar políticas de remuneração. A aplicação efetiva começa no exercício de 2026, com exigências relacionadas aos ILPs sendo implementadas de forma escalonada até 2028.
Assessoria especializada: um diferencial estratégico
Nesse contexto de transformação regulatória e evolução das práticas de remuneração, contar com uma assessoria especializada pode ser decisivo. Assim, se sua empresa está buscando se adaptar às novas exigências ou deseja revisar sua política de ILP, os especialistas da PRIS estão prontos para auxiliar.
Leia a íntegra da Resolução BCB nº 432/2024

